Nós estamos destacando trechos do artigo “Business and Buddhist Ethics” [Ética nos Negócios e Budista], de autoria de Subhavadee Numkanisorn, visando o conhecimento e o entendimento sobre o sistema de pensamento (ética, princípios e valores), o sistema organizacional (ambiente de trabalho, de relacionamentos e de políticas) e o sistema de tomada de decisões (propósitos, resultados e metas) de uma Organização Baseada na Espiritualidade (OBE), sendo esse tipo de Organização uma tendência global irreversível para as pequenas, as médias e as grandes Empresas, em quaisquer mercados de atuação, que visam a agregação de valor para todos os envolvidos nos negócios, assim como a sua própria perenidade.
Fonte:
The Chulalongkorn Journal of Buddhist Studies – An Academic Journal Devoted to the Academic Study of Buddhism [The Chulalongkorn Journal of Buddhist Studies – Um Periódico Acadêmico Dedicado ao Estudo Acadêmico do Budismo].
Publicado por Center for Buddhist Studies [Centro para Estudos Budista] – Universidade Chulalongkorn, Tailândia.
Conselho Consultivo
- Phra Dhammakosacharn
- Wit Wisadavet
- Sunthorn Na-rangsi
- Preecha Changkhwanyuen
- Mark Tamthai
- Donald K. Swearer
Editor
Somparn Promta – [email protected]
Site: Vol. 1 No. 2 (2002): July – December | The Chulalongkorn Journal of Buddhist Studies
Tradução livre Projeto OREM® (PO)
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THE CHULALONGKORN JOURNAL OF BUDDHIST STUDIES
An Academic Journal Devoted to the Academic Study of Buddhism
Published by Center for Buddhist Studies
Chulalongkorn University
Volume 1-3
[2002-2004]
EDITED BY
Somparn Promta
Department of Philosophy
And Center for Buddhist Studies
Chulalongkorn University
Bangkok, Thailand
SUMÁRIO
- From the Editor [I] – Somparn Promta
- Theravāda Buddhist Ethics [1] – Wit Wisadavet
- A Concept of Rights in Buddhism [17] – Somparn Promta
- Business and Buddhist Ethics [39] – Subhavadee Numkanisorn
- Administration of the Thai Sangha [59] – Sunthorn Na-rangsi
- The Application of Buddhist Ethics to Thai Society [75] – Preecha Changkhwanyuen
- Buddhist Perspectives on Health and Healing [93] – Wichit Paonil and Luechai Sringernyuang
- Consumerism, Prostitution, and Buddhist Ethics [107] – Phra Somsak Duangsisen
- Dhammic Socialism: Political Thought of Buddhadāsa Bhikkhu [115] – Preecha Changkhwanyuen
- How Should We Understand the Dhamma [139] – Buddhadāsa Bhikkhu and M.R. Kukrit Pramoj
- The Buddhist Philosophy of Education [159] – Wit Wisadavet
- Buddhadāsa Bhikkhu and Dhammic Socialism [189] – Tavivat Puntarigvivat
- Going Forth in Thai Society [209] – Chamnong Adiwathanasiddhi
- Political Beliefs of the Thai Sangha [219] – Pholsak Jirakraisiri
- Buddhism and Human Genetic Research [233] – Somparn Promta
- Buddhist Analysis of Capitalism [247] – Preecha Changkhwanyuen
- Boonnoon’s Critique of Thai Sangha [261] – Pagorn Singsuriya
- Buddhist Economics and the Asoke Buddhist Community [271] – Suwida Sangsehanat
Do Editor
Convite para se Juntar ao Mundo dos Estudos Budistas
“O Chulalongkorn Journal of Buddhist Studies é um humilde periódico dedicado principalmente a publicar artigos sobre o estudo acadêmico do Budismo. Como nós entendemos, pode haver vários entendimentos em relação ao termo ‘estudos Budistas’. No entanto, o nosso entendimento dessa palavra parece seguir o que foi dito pelo próprio Buda. O Budismo nos ensina a explorar o que deve ser considerado como os valores da vida. Normalmente, a visão Budista sobre o valor da vida está intimamente relacionada a uma coisa chamada ‘verdade’. Nós pensamos que o objetivo básico do estudo do Budismo é a verdade, ou um caminhar perto da verdade. A verdade, em nossa visão, é alguma coisa que é capaz de nos dar pelo menos duas coisas, a saber, sabedoria e felicidade. Portanto, embora esse periódico seja acadêmico, nós esperamos que o que for encontrado nele possa promover a verdade, como dito acima.
A internet tem o potencial de nos fazer superar algumas limitações dadas a nós por condições naturais e não naturais. No passado, publicar um livro ou algum tipo de escrito nunca poderia ser independente da comercialidade. Exatamente, o propósito básico da publicação de livros é unir duas pessoas: o escritor e o leitor. Isso não é diferente do propósito de produzir quaisquer bens em que duas pessoas, a saber, a pessoa que produz e a pessoa que consome, estão interligadas. A internet nos dá uma chance para o leitor e o escritor se encontrarem sem a terceira pessoa que no passado tinha o papel principal em decidir se, nesse caso, ela permitiria ou não que essas duas pessoas se encontrassem. O periódico online é barato e é capaz de ser livre da influência da comercialidade. Em textos Budistas, às vezes uma parábola das velas é dada pelo Buda para ilustrar como o Budismo concebe uma coisa chamada caridade. Como nós sabemos, um dos grandes ensinamentos do Budismo é um ensinamento sobre doação. Nós sabemos disso por meio de uma palavra Páli ‘dāna’. A doação na perspectiva Budista é feita para fornecer pelo menos duas coisas para o doador: felicidade e sabedoria. Quando nós damos; isso é como acender uma vela no escuro. Quando os nossos amigos vêm à nossa casa e pedem permissão para acender as velas deles com a nossa vela; isso é um grande prazer para nós em permitir que os nossos amigos obtenham o que eles necessitam. Quando nós decidimos lançar esse periódico, a imagem das velas ditas acima apareceu em nossa mente.
Todos os escritos nesse periódico são totalmente doados gratuitamente para o leitor. Como nós pensamos que ninguém no mundo é capaz de ser visto como o doador ou o tomador sozinho, o que nós temos feito em nome do editor e do escritor e outra pessoa relacionada é visto por nós como um tipo de ação feita por amigo para o amigo. Mesmo para o leitor que sente que ele prefere ler a escrever, apenas ler é o suficiente para nos fazer sentir que nós temos alguma coisa dada por nosso leitor. Méritos nos ensinamentos Budistas são realizados sob esse entendimento da amizade entre homem e homem e entre homem e outros seres sencientes. Chegando a esse ponto, o editor gostaria de aproveitar essa oportunidade para convidar os estudiosos do Budismo a partir de qualquer parte do mundo para se juntarem ao periódico. Há algumas informações primárias sobre o periódico a serem declaradas como segue. Primeiramente, como nós sentimos que o nosso periódico deve ser amigável e natural, a maneira do periódico é projetada para servir a esse propósito tanto quanto possível. Em qualquer periódico em Inglês, nós pensamos que um dos muitos padrões exigidos é o idioma. Parece que para atender a esse requisito, o nosso periódico deve ter o editor de idioma responsável por esse assunto. No entanto, nós decidimos evitar o uso do editor de idioma pela principal razão de que nós queremos que o nosso periódico seja natural. O Inglês agora é usado por um grande número de pessoas no mundo que não usam o Inglês como primeira língua. Até mesmo o editor desse periódico é aquele que tem aprendido Inglês como segunda língua e não usa o Inglês na vida diária. Se nós aceitamos a verdade de que para amigos as ações erradas não são importantes, nós esperamos que os nossos amigos que usam o Inglês como língua nativa tenham paciência para ver o Inglês em outros estilos, mesmo no estilo errado de acordo com os seus padrões.
Para aqueles que desejam se juntar a nós, por favor enviem os artigos ou quaisquer formas de escritos acadêmicos sobre o Budismo para o editor por meio do endereço de e-mail fornecido. Nós temos vários estudiosos Budistas para ler os manuscritos antes da publicação. No entanto, o processo de revisão por pares é feito sob entendimentos amigáveis, como dito anteriormente. Nós não esperamos uma coisa normalmente chamada de padrões acadêmicos se essa coisa significa ‘o que você deve fazer é como escrever uma tese para um mestrado ou doutorado’. O que nós esperamos é que o artigo tenha algum ponto para fazer o leitor entender melhor o Budismo. Nós temos tentado o máximo possível fazer o formato do periódico artístico e bonito. Todos os artigos publicados são formatados em formato PDF e organizados de forma que o leitor seja capaz de imprimi-los pessoalmente e ter um belo volume. No futuro, nós esperamos que o número de volumes aumente; e por essa razão nós temos projetado todas as coisas para fazer o periódico, quando impresso para uso pessoal, formar um conjunto de livros com design artístico e bonito. Além do periódico, outra coisa que nós temos concebido em nossa mente é se for possível publicar e-books sobre o estudo acadêmico do Budismo, nós faremos isso. E certamente, espera-se que esses e-books sejam de distribuição gratuita, assim como o periódico.
Nós fazemos o nosso trabalho de coração.
Somparn Promta
Centro de Estudos Budistas e Departamento de Filosofia
Chulalongkorn Unibersity Bangkok, Thailand.”
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ÉTICA NOS NEGÓCIOS E BUDISTA
Por Subhavadee Numkanisorn
“Os negócios podem ser vistos como uma parte importante do mundo moderno. A vida econômica desempenha um papel significativo no cotidiano das pessoas. Como a vida humana contém tantas dimensões além da econômica, a vida humana vista apenas pela dimensão econômica poderia ser considerada muito limitada. No entanto, a maioria das pessoas no mundo de hoje parece ser dirigida pela economia como se isso fosse tudo na vida. Esse fato leva à questão de como a religião beneficiará as pessoas nesse contexto. O autor pretende responder a essa pergunta, baseando as suas ideias nos ensinamentos Budistas. Os principais pontos do artigo se concentrarão em: ‘Como fazer negócios e ter uma vida feliz, tanto para os indivíduos quanto para a sociedade, ao mesmo tempo.’
O conceito de benefício no Budismo
O Budismo sempre aceitou a verdade de que a felicidade é uma parte essencial da ética. A felicidade dá significado à prática do dhamma e forma a base ou o suporte para a observância religiosa, tanto no nível da prática do dhamma quanto no nível da ética em geral.[1] Portanto, todas as pessoas devem ter a felicidade adequada, de acordo com a sua posição na vida. A partir da visão Budista da felicidade, que a divide em três níveis — felicidade sensual (kāmasukha), felicidade jhāna (a felicidade dos estados de absorção meditativa) e felicidade nibbāna — nós vemos que a busca pela felicidade no nível sensual, ou felicidade física ou material, não está em desacordo com a ética Budista se nós não permitirmos que as nossas mentes se apegue obsessivamente por ela ou se prenda firmemente a ela e se as nossas mentes estiverem livres e prontas para ascender a níveis mais elevados de felicidade.
[1] Phra Rājavaramunī, Buddhadhamma (Bangkok: Mahāchulālongkorn University Press, 1986), pp.
O Budismo acredita que a mente conduz todos os tipos de ações.[2] A mente ou consciência no nível da percepção [consciousness] é o que reconhece o contato mental (phassa) que dá origem à alegria e à tristeza.[3] As pessoas sentem-se satisfeitas quando elas sentem sentimentos agradáveis e descontentes quando experienciam sofrimento. Os seres humanos, portanto, amam a felicidade e odeiam o sofrimento. Assim, os seres humanos evitam o contato que leva ao sofrimento e buscam apenas o contato que leva à felicidade e por isso eles são amantes de si mesmos. Como os seres humanos amam a si mesmos e amam a felicidade e odeiam o sofrimento, eles têm que se libertar da exploração, porque isso lhes causa sofrimento e encontrar benefício, porque isso lhes traz felicidade.
[2] Khuddaka Nikāya, Dhammapada, 25/1-2. (O Tipiṭaka usado pelo autor nesse artigo é a versão Royal Thai, os comentários e subcomentários são o Editor da versão Pāli Syāmraṭṭha.)
[3] Khuddaka Nikāya, Suttanipāta, 25/877.
De acordo com o Budismo, ‘benefício’ significa coisas que conduzem à felicidade (attha), coisas que auxiliam na experiência da felicidade (hita) e coisas que são a própria felicidade (sukha),[4] e, ao estabelecer tal benefício, os seres humanos têm que criá-lo para si mesmos, para os outros e ambos para si mesmos e para os outros, conforme descrito nas palavras do Buda:
[4] Paramatthamañjusā, 4/32.
Você deve refletir assim: Ao considerar os seus próprios benefícios, é apropriado que você os alcance com diligência; ao considerar os benefícios dos outros, é apropriado que você os alcance com diligência; e ao considerar os benefícios de si mesmo e dos outros, é apropriado que você os alcance com diligência.[5]
[5] Aṅguttara Nikāya, Sattakanipāta, 23/72.
Dentre esses três tipos de benefício, o benefício produzido tanto para si mesmo quanto para os outros é considerado o de maior valor. Em seguida, vem o benefício produzido para si mesmo e produzir benefício para os outros é o terceiro, conforme declarado:
[6] Aṅguttara Nikāya, Catukkanipāta, 21/95
Entre dois grupos de pessoas, aqueles que não praticam nem para o seu próprio benefício nem para o benefício dos outros e aqueles que praticam para o benefício dos outros, mas não para o seu próprio benefício, aqueles que praticam para o benefício dos outros, mas não para o seu próprio benefício são os melhores. Entre três grupos de pessoas… (os dois grupos mencionados acima) e aqueles que praticam para o seu próprio benefício, mas não para o benefício dos outros, aqueles que praticam para o seu próprio benefício, mas não para o benefício dos outros são os melhores. Entre quatro grupos… (os três grupos mencionados acima) e aqueles que praticam tanto para o seu próprio benefício quanto para o benefício dos outros, aqueles que praticam tanto para o seu próprio benefício quanto para o benefício dos outros são os mais excelentes, especiais, eminentes, perfeitos e preciosos.[6]
[6] Aṅguttara Nikāya, Catukkanipāta, 21/95
Esse trecho demonstra que a essência do conceito de produzir benefício, segundo o Budismo, reside no benefício que leva à felicidade tanto para si mesmo quanto para os outros. O benefício não é recebido apenas por si mesmo e não apenas pelos outros. Assim, a ideia Budista de criar benefício refere-se à harmonização dos interesses do indivíduo e da sociedade. O Budismo, no entanto, admite que cada um deve produzir primeiro o seu próprio benefício, pois se todos pudessem produzir o seu próprio benefício, o resultado também beneficiaria os outros e a sociedade como um todo. Quando cada pessoa é autossuficiente, ele ou ela não sobrecarrega os outros e também é capaz de ajudar os outros.[7]
[7] Vinayaṭṭhakathāṭīkā, 1/365.
A partir do exposto, nós podemos resumir a relação entre ética Budista, felicidade e benefício da seguinte forma:
1. A conduta e o comportamento no curso do caminho (magga) levarão aos benefícios que são a meta da vida, que o Budismo divide em três níveis: 1) benefícios obteníveis aqui e agora, visíveis em nossa vida cotidiana; 2) benefícios adicionais, que são os benefícios espirituais; e 3) o benefício mais elevado, o benefício que é a meta mais elevada do Budismo, que é nibbāna. O Budismo aceita a importância de todos esses níveis de benefícios ou metas. Ao mesmo tempo, ele aponta que, embora nem todas as pessoas sejam capazes de atingir a meta mais elevada, nibbāna, elas devem se direcionar para alcançar os benefícios imediatos e os benefícios adicionais. Nós podemos dizer que o andamento da conduta para alcançar cada um desses níveis ou metas é praticar de acordo com o caminho (magga). Ao praticar esse caminho, tem-se que começar desenvolvendo a si mesmo, tornando-se alguém que sabe como pensar e examinar as coisas que vê e ouve com prudência (yoniso manasikāra), que é um fator interno e também ter boa orientação a partir de bons amigos (kalyāṇamitta), que é um fator externo.
2. O Budismo aceita a importância de todos os níveis de felicidade na vida, incluindo a felicidade física ou material. Para obter felicidade nesse nível, no entanto, a moralidade tem que ser empregada como diretriz, a fim de evitar a exploração tanto de si mesmo quanto dos outros.
3. O Budismo acredita que o benefício não é apenas alguma coisa que aumenta o surgimento da felicidade, mas também a felicidade em si. A criação de benefício, portanto, deve ser para si mesmo e para os outros. O Budismo ensina as pessoas a considerarem a si mesmas e aos outros. Em outras palavras, a fazerem coisas que harmonizem o benefício próprio e o dos outros. Qualquer ação que leve ao dano ou seja prejudicial aos outros não deve ser realizada, pois todas as pessoas se amam. Portanto, nós não devemos prejudicar os outros. Os princípios da criação de benefício, de acordo com a perspectiva Budista, assemelham-se à visão econômica do Liberalismo, pois ambos aceitam que todos os seres humanos amam a si mesmos e é esse amor a si mesmo que motiva as pessoas a buscarem o próprio benefício delas. A diferença é que, ao criar esse benefício, o Budismo leva em consideração o benefício dos outros e considera a criação de benefício para si mesmo e para os outros como algo de maior valor do que criar benefício apenas para si mesmo ou apenas para os outros. O Liberalismo considera que criar benefício econômico para si mesmo será, ao mesmo tempo, benéfico para os outros, embora esse benefício que surge para os outros não seja um alvo como no Budismo.
A vida econômica do Budista
Como os seres humanos têm que inevitavelmente se envolver com coisas materiais, visto que as suas vidas dependem naturalmente delas, eles têm que ter bens materiais como comida, roupas, moradia e medicamentos para sobreviver. Como os seres humanos têm que se envolver com coisas materiais, eles inevitavelmente têm que se envolver em um sistema econômico ou outro.
Magga, o sistema de conduta Budista, contém um fator conhecido como sammā-ājīva, que significa modo de vida correto, indicando que o Budismo também aceita a importância da economia. O Budismo admite e confirma a importância das coisas materiais, particularmente dos quatro suportes, como aparece na declaração do Buda, por exemplo, de que ‘sabbe sattā āhāraṭṭhitikā’ [8], que se traduz como ‘todos os seres subsistem de comida’. Os requisitos para os quatro suportes têm que ser em quantidade adequada para que o corpo funcione normalmente — seguro e livre de doenças — para que alguém seja capaz de desempenhar deveres e cultivar virtudes mentais superiores e sabedoria.
[8] Dīgha Nikāya, Pāṭikavagga, 11/226.
Consumo
De acordo com o Caminho do Meio (majjhimā paṭipadā), o comportamento em termos de consumo consiste em seguir o princípio de mattaññutā mencionado no Ovādapāṭimokkha. O princípio é levar uma vida simples, vivendo moderadamente. Para determinar o que é moderado, deve-se usar o princípio de yoniso-manasikāra (atenção sábia). O princípio em relação ao consumo é não consumir por diversão, não se deixar levar pelo consumo e não consumir para ornamentação ou decoração, mas para a subsistência do corpo, para que a vida continue, para o alívio do desconforto físico e de sentimentos dolorosos como a fome e para viver confortavelmente o suficiente para praticar níveis mais elevados de dhamma. Os outros três suportes, moradia, vestuário e medicina, também aplicam princípios semelhantes, como segue: Moradia: para proteção contra perigos naturais, como o vento e a luz solar. Vestuário: para proteção contra animais nocivos, insetos, frio, calor, etc. Medicamentos: para alívio de dores físicas causadas por doenças.
A forma de consumo segundo a ética Budista é, portanto, o consumo econômico, pois é o consumo de acordo com a necessidade física. Os recursos são usados apenas para o que é realmente necessário. Além disso, esse conceito de consumo ajudará a estabelecer e incutir hábitos e valores adequados em relação ao consumo, corrigindo a abordagem de consumo nas economias liberais atuais, que enfatiza e promove valores extravagantes nos consumidores por meio da publicidade na mídia de massa. O resultado é que as pessoas na sociedade tendem a consumir coisas desnecessárias para a vida a fim de expressar o status social delas. Valores e quantidades sociais, portanto, tornaram-se fatores na precificação de produtos e serviços. De acordo com os princípios gerais da economia, se um produto for barato, as pessoas terão mais poder de compra e o volume de vendas aumentará, porém, se o produto ficar mais caro, o poder de compra das pessoas será reduzido e o volume de vendas diminuirá. A situação atual, no entanto, em que os valores das pessoas tendem à ostentação de status e riqueza, é que quanto mais alto o preço, mais pessoas querem comprá-lo, pois produtos caros refletem status social. Os hábitos e valores de consumo tornaram-se um fator importante para a produção de bens e serviços desnecessários, o que consequentemente leva ao desperdício extravagante de nossos limitados recursos naturais e nós vemos esses hábitos e valores citados quando pessoas de negócios sustentam que elas incentivam valores imorais apenas em resposta a demandas sociais, apesar que tal demanda é criada pelos próprios negócios.
Para itens além dos quatro suportes, que são necessários à subsistência dos seres humanos, o valor e a importância variam em relação às condições sociais e fatores pessoais, como a sabedoria para entender as vantagens, desvantagens e limitações dos bens materiais, bem como a capacidade de atingir níveis de felicidade superiores à felicidade sensual. Por essa razão, o Budismo não se interessa em estipular que cada pessoa deva ter a mesma quantidade de pertences, visto que tal não é um critério para a felicidade e o bem-estar das pessoas. O Budismo se preocupa com o padrão mínimo, que todas as pessoas devem ter os quatro suportes em quantidade suficiente para que as vidas delas prossigam sem problemas. Além disso, o Budismo permite tantas posses quanto a situação e o desenvolvimento espiritual permitirem, no entanto, dentro do limite de que tais posses não têm que ser motivo para exploração de si mesmo ou dos outros. Algumas pessoas se contentam com apenas posses materiais suficientes para sobreviver, voltando o foco delas para o desenvolvimento espiritual e intelectual. Outras ainda não estão prontas, as vidas delas dependem mais de bens materiais. Se o modo de vida delas não causar sofrimento aos outros, isso é aceitável. Além disso, algumas pessoas têm a tendência, a habilidade e a capacidade de ajudar outras pessoas. Para elas, uma grande parte da riqueza será em benefício de seus semelhantes.
Riqueza e competição
Tendo em quantidade suficiente os quatro apoios necessários, deve-se buscar mais riqueza para poder gerar benefícios de outros tipos. Os chefes de família não têm que apenas zelar pelo seu próprio bem-estar físico, mas também assumir outros encargos para os quais a riqueza material é necessária. Por exemplo, eles têm que cuidar das pessoas que dependem deles, como as suas famílias e também participar de serviços sociais, além de ajudar a apoiar a disseminação de dhamma para uma vida melhor. Portanto, os chefes de família têm encargos econômicos e têm que buscar mais riqueza.[9]
[9] Phra Dhammapiṭaka, Economia Segundo o Budismo (Bangkok: Mahāchulālongkorn University Press, 1994), p. 63.
Nós vemos a partir do exposto que, além dos quatro suportes da vida, o Budismo também permite que os chefes de família busquem riqueza e a possuam de acordo com a capacidade e disposição deles, mas dentro de limites e desde que isso não implique em exploração de si mesmos e dos outros. Esse ponto está em consonância com o direito de propriedade na economia Liberal. No entanto, o Budismo não apenas considera que uma grande quantidade de riqueza permite que os proprietários tragam bem-estar para si mesmos, as suas famílias e os seus dependentes, mas também espera que eles usem a riqueza adquirida para ajudar outras pessoas na sociedade, bem como para apoiar atividades religiosas. Ou seja, ele ainda enfatiza os valores espirituais.
O Buda ensinou aos chefes de família o caminho para alcançar o benefício e a felicidade no aqui e agora, ou o chamado ‘diṭṭhadhammikattha’, que é a estabilidade econômica, tornando-se rico o suficiente para a autossuficiência. As qualidades que levam ao benefício no aqui e agora, o diṭṭhadhammikattha, são quatro em número, a saber:
1. Uṭṭhānasampadā, doação com esforço persistente: ser diligente em suas responsabilidades e trabalho; manter um meio de vida honesto, desenvolver habilidades e buscar sabiamente meios eficazes para atingir esses objetivos.
2. Ārakkhasampadā, doação com proteção: guardar a própria riqueza e os frutos do trabalho obtidos legitimamente por meio de seus esforços, não permitindo que sejam ameaçados ou decaiam.
3. Kalyāṇamittatā, doação com bons amigos: entender as pessoas em sua região, escolher associar-se, conversar, estudar e imitar aqueles que são virtuosos e eruditos.
4. Samajīvitā, doação com um meio de vida equilibrado: determinar moderadamente a renda e os gastos com o meio de vida, não permitindo que a vida seja muito austera ou muito extravagante, de modo que a renda seja maior que os gastos e que haja um excedente para poupar. Aqueles que são capazes de cumprir esses quatro princípios encontrarão felicidade em sua riqueza por meio da moderação, que é um tipo de felicidade[10]
[10] Aṅguttara Nikāya, Aṭṭhakanipāta, 23/145.
Esses quatro princípios demonstram que, segundo o Budismo, os fatores importantes para a estabilidade econômica são manter um meio de vida honesto e diligente, além de saber como ser econômico e poupar. Nesse sentido, pessoas muito diligentes obterão cada vez mais riqueza, o que significa que cada pessoa precisa competir consigo mesma o máximo possível: quanto mais diligente for, mais riqueza assegurará. De acordo com o princípio da criação de benefícios, uma vez obtido o benefício para si mesmo, ele também conduz ao benefício para os outros.
O Budismo não julga a bondade ou maldade das pessoas pelo tamanho de sua riqueza, pois a riqueza é considerada apenas uma escada para outras metas, não uma meta em si mesma. Se a posse de riqueza é incentivada ou não depende das metas para as quais ela é utilizada. Consequentemente, existem dois pontos de interesse em relação à riqueza para o Budismo: as maneiras como a riqueza é obtida e a conduta em relação à riqueza assegurada. Em outras palavras, o Budismo não enfatiza a riqueza em si mesma, mas a sua busca e o seu uso.
Como o Budismo dá tanta importância às maneiras de buscar e usar riqueza, além de competir consigo mesmo para obter mais riqueza, a competição justa com os outros por melhor eficiência e por maiores benefícios para si mesmo e para os outros não deve ser contra os princípios Budistas.
O Budismo tem mencionado muitos tipos diferentes de buscadores de riqueza. Aqui, eu gostaria de mencionar três, a saber:
1. Pessoas que buscam riqueza de forma imprópria e egoísta, além disso não a gastam em seu conforto, não dão esmolas e não obtêm mérito.
2. Pessoas que buscam riqueza de forma imprópria e egoísta, além disso a gastam em seu conforto, mas não dão esmolas e não obtêm mérito.
3. Pessoas que buscam riqueza de forma imprópria e egoísta, além disso a gastam em seu conforto, dão esmolas e obtêm mérito.
Entre esses três tipos de pessoas, aqueles que buscam riqueza de forma imprópria e não a usam para o seu próprio conforto são prejudiciais tanto para si mesmos quanto para a sociedade. Eles se prejudicam por não obterem felicidade com a riqueza que adquiriram. Além disso, podem ser punidos por sua má conduta, o que afeta negativamente as pessoas em geral, pois é uma forma de destruir o ciclo econômico, pois a riqueza não circula adequadamente. O segundo grupo se prejudica parcialmente, pois busca riqueza de forma imprópria. No entanto, usa a sua riqueza apenas para o seu próprio conforto, portanto, não é vantajoso para a sociedade. O terceiro grupo se prejudica parcialmente e a sociedade, mas também é parcialmente vantajoso para a sociedade, pois usa a sua riqueza para si mesmo, para dar esmolas e para obter méritos.
Além disso, ter ou adquirir riqueza e depois simplesmente acumulá-la também é considerado errado, assim como buscar riqueza de forma imprópria e usá-la de forma indevida.
O Buda criticou um milionário muito rico que tinha acumulado uma grande quantidade de riqueza e posses, mas que vivia de uma alimentação ruim, à base de arroz quebrado e vinagre, usava apenas três peças de tecido de granulação grossa, um veículo velho e um guarda-sol feito de folhas. Ele morreu sem deixar descendentes para herdar a sua riqueza. O Rei Pasenadi de Kosala teve que transportar a riqueza não herdada para o palácio. O Buda criticou o milionário que possuía riqueza sem fazer uso dela da seguinte forma:
Assim é, Sua Majestade. O homem indigno, ao adquirir grande riqueza, não a gasta para a sua própria felicidade e conforto, não a gasta para a felicidade e conforto de seus pais… de seus filhos e da sua esposa… de seus servos e dos seus trabalhadores… de seus amigos e colegas, não faz oferendas a reclusos e homens santos (samaṇa brahmaṇa) que visam a felicidade espiritual e conduzem ao paraíso. Essa riqueza dele, se não for usada corretamente, é inevitavelmente tomada pelas autoridades estatais, roubada por ladrões, destruída no fogo ou perdida na água, ou tomada por parentes não amados. Essa riqueza, se não for usada corretamente, desaparece sem utilidade, sem ser consumida. Ela é como um lago em uma terra de demônios, cheio de água limpa, fresca, transparente, com boas fontes, um lugar sombreado. Ninguém é capaz de usar a água para beber ou tomar banho.
Quanto ao homem digno, tendo acumulado grande riqueza, ele a gasta para a sua própria felicidade e conforto, gasta-a para a felicidade e conforto de seus pais… da sua esposa e dos seus filhos… de seus servos e seus trabalhadores… de seus amigos e colegas e deposita oferendas a reclusos e homens santos que visam a felicidade espiritual e conduzem ao céu. Essa riqueza, usada corretamente, não pode ser tomada pelas autoridades estatais, ladrões não podem roubá-la, o fogo não pode queimá-la, a água não pode varrê-la e parentes não amados não podem levá-la embora. Essa riqueza, usada corretamente, é consumida, não desperdiçada, assim como um lago perto de uma vila ou cidade mercantil, cheio de água limpa, fresca, doce e límpida, com bons acessos e ambiente de sombra. As pessoas são capazes de virem e pegarem a água, beber, banhar-se ou usá-la como desejarem.[11]
[11] Aṅguttara Nikāya, Aṭṭhakanipāta, 23/145.
Uma pessoa má, tendo acumulado riqueza, não a usa para si mesma nem a dá (a ninguém). Assim como um lago em uma terra de demônios, as pessoas não são capazes de beber ou usar a sua água. Uma pessoa sábia, tendo acumulado riqueza, usa-a para si mesma e para as suas tarefas (atividades pessoais e caridades). Ela é excelente. Tendo cuidado de seus parentes, ela é irrepreensível. Ela alcança o paraíso.[12]
[12] Saṃyutta Nikāya, Sagāthavagga, 15/386–9.
O Buddhavacana acima nos ensina que se deve utilizar riquezas ou posses, não apenas acumulá-las inutilmente. A presença de riqueza tem como propósito o benefício. Quanto às maneiras pelas quais a riqueza deve ser usada, nós devemos seguir a diretriz dos cinco princípios de bhoga-ādiya, que são:
1. Usar a riqueza para sustentar a si mesmo, a sua família e os seus pais confortavelmente.
2. Usar a riqueza para cuidar confortavelmente dos amigos e colegas.
3. Usar a riqueza para proteção contra perigos e danos.
4. Para fazer balī, os cinco tipos de oferendas:
4.1 Atithibalī: oferendas dadas como recepção para convidados.
4.2 Ñātibalī: oferendas para parentes.
4.3 Rājabalī: oferendas feitas ao estado, como impostos e taxas.
4.4 Devatābalī: oferendas feitas a divindades, os objetos adorados de acordo com crenças ou tradições sociais.
4.5 Pubbapetabalī: oferendas feitas aos falecidos.
5. Apoiar os reclusos e os homens santos, monges que se conduzem corretamente, praticam bem e se desenvolvem, que não são descuidados nem se deixam levar pela paixão e que mantêm a retidão na sociedade.[13]
[13] Phra Dhammapiṭaka, Economia Segundo o Budismo, pp. 57–58.
Quanto aos métodos de divisão de gastos, eles são apresentados nos quatro bhogavibhāga, que ensinam a divisão da riqueza em quatro partes. A primeira parte é para o consumo na própria subsistência, para sustentar confortavelmente a família e as pessoas sob os seus cuidados, bem como para a realização de boas ações em benefício público. A segunda e a terceira partes são para investimento. A quarta parte deve ser mantida como poupança para uso em caso de necessidade, pois pode haver perigos, acidentes ou obstáculos na ocupação de alguém, como doenças.[14]
[14] Ibid., p. 57.
No entanto, mesmo que se busque a riqueza corretamente e a gaste de forma benéfica, isso ainda não é considerado a perfeição de conduta em relação à riqueza, de acordo com a Doutrina. O dhamma também enfatiza os valores espirituais e intelectuais, como afirmado pelo Buda:
Monges, esses três tipos de pessoas existem no mundo: a cega, a de um olho e a de dois olhos. O que são as cegas? Algumas pessoas nesse mundo não têm o olho que ajuda a obter riqueza ainda não obtida e a aumentar a riqueza já conquistada; nem de fato elas têm o olho que ajuda a reconhecer qualidades hábeis (kusaladhamma) e qualidades inábeis (akusaladhamma)… qualidades que são prejudiciais e aquelas que não são prejudiciais… o inferior e o superior… o preto e o branco. Essas são as pessoas cegas. Como são as pessoas de um olho? Algumas pessoas nesse mundo têm o olho que ajuda a obter riqueza ainda não obtida e a aumentar a riqueza já conquistada, entretanto, não o olho que ajuda a conhecer qualidades hábeis (kusaladhamma) e qualidades inábeis (akusaladhamma)… qualidades que são prejudiciais e aquelas que não são prejudiciais… o inferior e o superior… o preto e o branco. Essas são as pessoas de um olho. Como são as pessoas de dois olhos? Algumas pessoas nesse mundo têm o olho que ajuda a obter riqueza ainda não obtida e a aumentar a riqueza já conquistada e também têm o olho que ajuda a conhecer qualidades hábeis (kusaladhamma) e qualidades inábeis (akusaladhamma)… qualidades que são prejudiciais e aquelas que não são prejudiciais… o inferior e o superior… o preto e o branco. Essas são as pessoas de dois olhos.
Aquelas que são cegas ou têm problemas de visão estão em má situação em ambos os sentidos: não ganham riqueza e não obtêm nenhum benefício. O outro tipo de pessoa, a de um olho, ocupa-se em garantir riqueza, tanto de forma legítima quanto injusta, seja roubando, trapaceando ou enganando. Essas pessoas são hábeis em acumular riqueza, mas depois elas vão para o inferno e a de um olho se mete em problemas. Quanto à de dois olhos, elas são aquelas excelentes: elas compartilham uma parte da riqueza assegurada legitimamente por seus próprios trabalhos com outras pessoas. Elas possuem pensamentos nobres e determinação, por isso elas estão destinadas a um bom destino e não vivem em sofrimento. Mantenha distância das pessoas cegas e daquelas de um olho e associe-se com a excelência daquelas de dois olhos.[15]
[15] Aṅguttara Nikāya, Tikanipāta, 20/468.
A conduta verdadeiramente adequada em relação à riqueza, segundo o dhamma, é ter uma atitude conhecida como nissaraṇapaññā. Isso significa ser sábio e entender os verdadeiros valores e benefícios da riqueza, bem como as limitações desses valores e benefícios; ter uma mente livre, não escrava, mas mestra da riqueza. A riqueza deve ser nossa serva, nossa ferramenta para criar benefícios e bondade, para ajudar a aliviar o sofrimento e a promover a felicidade. Não se deve permitir que ela nos cause mais sofrimento, destrua a nossa saúde mental, destrua os valores humanos ou cause alienação entre os seres humanos.
Assim, entre aqueles que buscam riqueza, o Buda elogiou aqueles que buscam riqueza de forma correta e altruísta, que a usam para o próprio bem-estar deles, que dão esmolas, que buscam méritos, que não são gananciosos, não se deludem, nem se envolvem demais na riqueza e que estão atentos das desvantagens de buscar riqueza e empregam a sabedoria para afastar a obsessão por ela. Eles são louváveis por quatro motivos:
1. Eles asseguram riqueza de forma correta.
2. Eles gastam para o seu próprio bem-estar.
3. Eles dão esmolas e obtêm méritos.
4. Eles não são gananciosos, não se deludem, não se envolvem demais, mas estão cientes dos malefícios da riqueza e empregam a sabedoria para se libertarem da obsessão pela riqueza.
A conduta adequada em relação à riqueza, de acordo com a ética Budista, pode, portanto, ser resumida da seguinte forma:
1. Buscar: buscar riqueza de forma correta.
2. Usar:
a) para sustentar a si mesmo (e os seus dependentes).
b) para compartilhar com os outros.
c) para contribuir para atividades benéficas e meritórias.
3. Atitude em relação à riqueza obtida: não se deixar levar pela riqueza, mas utilizá-la estando atento de suas vantagens e desvantagens, ter uma mente que é livre e usar a riqueza para maior desenvolvimento espiritual e intelectual.[16]
[16] Phra Rājavaramunī, Buddhadhamma, p. 781.
A partir do resumo acima dos princípios Budistas para lidar com a riqueza, nós podemos ver que o Budismo dá liberdade a todas as pessoas na busca por riqueza. Todas as pessoas têm o direito de escolher uma ocupação de acordo com as suas habilidades e capacidades, entretanto, essa ocupação deve estar dentro dos limites da ética. Os bens obtidos por meio de trabalho legítimo podem ser usados para o conforto próprio, de sua família e de seus dependentes. Isso está em conformidade com os princípios econômicos do Liberalismo. A diferença, no entanto, é que, sejam os métodos de busca de riqueza ou o uso da riqueza já adquirida, a ênfase está nos valores espirituais e intelectuais. Ou seja, o Budismo não rejeita o conforto físico, no entanto, afirma que esse bem-estar físico deve ocorrer em conjunto com o desenvolvimento espiritual.
O Buda também mencionou quatro tipos de felicidade para uma pessoa leiga. Um chefe de família deve ter quatro tipos de felicidade, que são considerados coisas pelas quais ele deve se esforçar. Há, por exemplo, o Buddhavacana dirigido ao rico comerciante Anāthapiṇḍika:
Veja aqui, chefe de família. Esses quatro tipos de felicidade são coisas que um chefe de família, aquele que participa dos prazeres dos sentidos, deve sempre alcançar. São eles: atthisukha, bhogasukha, anaṇasukha e anavajjasukha.[17]
[17] Aṅguttara Nikāya, Catukkanipāta, 21/62.
Os quatro tipos de felicidade para um chefe de família são:
1. Atthisukha: a felicidade de ter posses, o orgulho e o contentamento de ter posses obtidas legitimamente com o suor do próprio rosto e com a força dos próprios braços, adquiridas legitimamente.
2. Bhogasukha: a felicidade de gastar, o orgulho e a satisfação de usar a riqueza que se conquistou legitimamente para se sustentar, para sustentar os seus dependentes e contribuir para atividades úteis. Ter bens, mas acumulá-los e não usá-los é avareza, prejudicial a si mesmo e à sociedade.
3. Anaṇasukha: a felicidade de não estar endividado. Estar endividado é considerado um tipo de sofrimento nesse mundo. O sofrimento dos credores é o medo de não conseguirem saldar as suas dívidas.
4. Anavajjasukha: a felicidade da conduta irrepreensível, de ter uma boa conduta sem falhas de qualquer natureza e que não seja censurável, seja no corpo, na fala ou na mente; não se comportar de maneira censurável.
Dentre esses quatro tipos de felicidade, o quarto, anavajjasukha, é o mais valioso de todos, pois é o que conecta a vida econômica com a vida saudável, a ser desenvolvida com perfeição. Nós podemos observar que o Budismo considera as questões econômicas como parte da vida. Além do bem-estar econômico, tem que haver também outros valores na vida. O bem-estar econômico deve ajudar a promover e nutrir a vida em outros aspectos, incluindo o espiritual. A riqueza deve, portanto, facilitar e capacitar os seres humanos a viverem com mais conforto e a estarem mais dispostos a levar uma vida saudável e a praticar boas ações, a fim de obter acesso a coisas cada vez mais saudáveis. Assim, o Budismo percebe a economia, a competição, a busca por riqueza e os gastos como parte de uma vida boa. Eles não são bons em si mesmos, mas bons porque ajudam a sustentar outros aspectos da vida, particularmente o espiritual. Em conclusão, o Budismo tem a seguinte atitude em relação à riqueza e à competição por riqueza:
1. Em termos individuais, o Budismo elogia apenas aqueles que enriquecem com o seu próprio trabalho árduo e honesto e que usam a riqueza deles para fins bons e salutares. Em outras palavras, ele elogia ser uma pessoa boa e útil acima de possuir riqueza. Nesse sentido, a competição por riqueza não é errada em si mesma, mas ela é errada se envolver métodos ilícitos ou conduta imoral.
2. Em termos sociais, a riqueza é uma ferramenta ou suporte para a vida, mas não é a meta da vida. A riqueza deve, portanto, ser alguma coisa que permita às pessoas viverem de forma mais conveniente e as prepare para levar uma vida saudável e praticar boas ações a fim de obter acesso ao bem maior, de acordo com a doutrina Budista. Quando a riqueza surge para uma pessoa, isso significa que a riqueza surgiu para a humanidade, ou que a riqueza surgiu na sociedade. Quando uma pessoa se torna rica, a sociedade assim se torna mais próspera e abundante. Desse modo, quando a riqueza surge para uma pessoa boa, é como se tivesse surgido para a sociedade. Essas pessoas ricas são comparadas a bons campos nos quais o arroz cresce para o benefício de todos,[18] e o Buda disse:
[18] Aṅguttara Nikāya, Aṭṭhakanipāta, 23/128.
‘A riqueza possuída por uma pessoa boa é como um lago em um lugar seguro: todas as pessoas são capazes de usá-lo e se beneficiar dele. A riqueza possuída por uma pessoa má é como um lago em uma terra de demônios: mesmo que a água seja límpida e refrescante, ela é inútil.’[19]
[19] Saṃyutta Nikāya, Sagāthavagga, 15/387.
Pessoas ricas, de acordo com esse princípio, devem, portanto, orgulhar-se como representantes que administram a riqueza para sustentar os seus semelhantes com conforto e dar-lhes a oportunidade de praticar boas ações.
Quando a riqueza surge para uma pessoa, isso significa que a riqueza surgiu para a humanidade, ou que a riqueza surgiu na sociedade.
O dever do Estado
No Budismo, também há menção aos princípios do governo. Por exemplo, um dos deveres de um imperador é compartilhar a riqueza com os necessitados.[20] O Budismo reconhece a importância da riqueza na sociedade mundana. A pobreza e a necessidade são causas importantes de crimes e males sociais,[21] e é considerado responsabilidade do Estado ou do governo cuidar e distribuir a riqueza aos cidadãos pobres e eliminar a pobreza do país. Para fazer isso, são necessários muitos métodos, adequados a cada situação, especialmente criando oportunidades para que as pessoas busquem meios de subsistência honestos, oferecendo apoio profissional, alocando fundos e equipamentos, bem como prevenindo e controlando métodos injustos e ilícitos, exploração, etc. Nós podemos ver, do ponto de vista Budista, que o Estado desempenha um papel importante na economia, ao contrário da economia do Liberalismo, na qual o Estado desempenha apenas um papel econômico secundário.
[20] Dīgha Nikāya, Pāṭikavagga, 11/35.
[21] Dīgha Nikāya, Pāṭikavagga, 39/11.
Metas do comportamento econômico e das atividades econômicas
A partir dos princípios Budistas que tratam da riqueza, até onde se é capaz de resumir a partir dos ensinamentos gerais, nós podemos ver que, no Budismo, o comportamento e as atividades econômicas não são separados de outras atividades da vida. Essa visão está de acordo com a prática na vida real, pois, na vida real, as atividades econômicas humanas não podem ser separadas das atividades em outras áreas. Uma vida boa implica boas atividades em muitas áreas, procedendo em harmonia.
Portanto, o comportamento, as atividades e os resultados econômicos são importantes em termos da ética Budista das seguintes maneiras:
1. Eles são fatores de apoio ou bases para a felicidade até certo ponto. Nós temos que admitir a verdade de que a prosperidade material nos ajuda a ser felizes. O Budismo também aceita essa verdade.
2. Eles são fatores ou bases para preparar os seres humanos para desenvolver a qualidade de suas vidas e o seu potencial humano. Um exemplo pode ser citado da época do Buda. Certa vez, quando o Buda estava em Jetavana, na cidade de Sāvatthī, ele viu em sua visão psíquica que um vaqueiro que vivia em Āḷavī estava pronto para alcançar dhamma, então ele foi até lá para dar um ensinamento a esse vaqueiro. Quanto ao vaqueiro, quando ele soube que o Buda estava chegando, ele quis ir ouvir o ensinamento, mas naquele momento uma de suas vacas desapareceu. Ele decidiu ir procurar a vaca em primeiro lugar e depois voltou para ouvir o ensinamento. Ele caminhou pela floresta procurando a sua vaca e finalmente a encontrou e a levou de volta ao curral, porém, naquele momento ele estava exausto. Entretanto, ele foi ao local que havia sido preparado para os ensinamentos do Buda.
Quando o Buda viu o vaqueiro se aproximando, ele percebeu que estava cansado e faminto, então ele pediu a um seguidor leigo que lhe preparasse comida para se fartar e então o Buda começou a ensinar. Após ouvir o ensinamento, o vaqueiro alcançou o fluxo de entrada (sotāpattiphala). Após dar o ensinamento, o Buda despediu-se do povo de Āḷavī e retornou a Jetavana, mas ao longo do caminho os monges que o acompanhavam especularam sobre as ações do Buda. O Buda então explicou a esses monges que ‘Pessoas dominadas pela fome, que sofrem com a fome, não estão em condições de entender um ensinamento.’[22]
[22] Phra Debvedī, Economia Budista (Bangkok: Buddhadhamma Foundation, 1988), pp. 5-6.
A partir dessa história, nós podemos ver que, se a barriga estiver vazia, as pessoas não entenderão um ensinamento; é por isso que o Buda deixou o vaqueiro saciar a sua fome em primeiro lugar. O aspecto financeiro é, portanto, uma questão muito importante. Por outro lado, o consumo ou a prosperidade econômica não são metas em si mesmos, mas a base para o desenvolvimento humano, para ajudar os seres humanos a alcançar uma melhor qualidade de vida e obter alguma coisa de maior valor. Por exemplo, o vaqueiro, tendo saciado a sua fome, ouviu o ensinamento. A criação de prosperidade econômica é uma tarefa importante, mas o progresso econômico e a prosperidade têm que estar relacionados à meta, para levar a uma qualidade de vida que prepare as pessoas para desenvolver o seu potencial, para criar ou praticar uma vida saudável.
O Budismo considera os aspectos econômicos apenas um fator ou uma atividade. A vida é uma união de muitos fatores e atividades, portanto, nós temos metas comuns na vida e na sociedade. O Budismo vê a vida, em consonância com essa meta comum, como um avanço para a liberação.
Cada momento da vida, conduzido corretamente, vem a ser treinamento, desenvolvimento de potencial e aumento da qualidade de vida. Portanto, nós devemos sempre garantir que a atividade econômica venha a ser parte do procedimento ou processo de desenvolvimento do potencial para aumentar a qualidade de vida, pois todos os aspectos da vida ou todas as atividades humanas estão relacionados e são interdependentes.
A criação de prosperidade econômica é uma tarefa importante, mas o progresso econômico e a prosperidade têm que estar relacionados à meta, para levar a uma qualidade de vida que prepare as pessoas para desenvolver o seu potencial, para criar ou praticar uma vida saudável.
Atividades que são realizadas corretamente, ou comportamento econômico adequado, são chamados de sammā-ājīva (Modo de Vida Correto), que é um elemento do modo de vida ou processo de vida conhecido como o Nobre Caminho Óctuplo, como mencionado anteriormente. Chegando a esse ponto, nós temos agora uma visão do status da economia na ética Budista, que significa: A prática econômica adequada é o Modo de Vida Correto; o Modo de Vida Correto é um fator do modo de vida Budista conhecido como o Nobre Caminho; o Caminho composto por oito fatores é o caminho para a meta comum final do Budismo. Nós podemos concluir a importância da economia a partir da perspectiva do Modo de Vida Correto da seguinte forma:
1. As atividades econômicas, chamadas de Modo de Vida Correto, fazem parte do sistema que desenvolve o potencial humano ou eleva a qualidade de vida ao nível da liberação e da paz. Como o Caminho tem esse objetivo, o Modo de Vida Correto, como um elemento do caminho, tem a mesma meta.
2. O Caminho é um sistema de prática que consiste em oito fatores. Esses fatores têm que ser interdependentes e cooperar e harmonizar para alcançar a meta do Budismo, que é uma vida saudável. Isso sugere que as atividades econômicas são um elemento interdependente de outros elementos no sistema de uma vida saudável.
A partir do exposto, nós podemos observar o modo de vida econômico Budista, bem como a importância e a relação da economia com o Budismo, da seguinte forma: uma boa vida econômica é um dos elementos que ajudam a atingir a meta Budista, que é uma vida saudável. O Budismo, portanto, não rejeita a riqueza econômica, pois a riqueza econômica, ou uma boa vida econômica, é capaz de permitir que os seres humanos avancem para metas melhores e mais elevadas do que isso.
A partir do estudo da economia segundo a ética Budista, nós podemos concluir que a ética Budista não entra em conflito com a economia Liberal, mas é ‘compatível’ quando algumas condições adicionais são aplicadas, conforme explicado abaixo:
1. O Budismo aceita os desejos e as buscas pessoais e aceita os benefícios obtidos aqui e agora, que são questões de felicidade física ou material, com a perspectiva de que a busca pelo próprio benefício tem que sempre levar em conta o benefício dos outros, harmonizando, de fato, o próprio benefício com o benefício dos outros.
2. O Budismo também aceita os direitos de propriedade, no entanto, os bens econômicos ou a riqueza não são metas em si mesmas, mas uma ponte para as metas físicas e espirituais de si mesmo e dos outros.
3. A busca por riqueza na visão Budista enfatiza métodos corretos de busca e gasto. A competição econômica justa, que não seja uma exploração de si mesmo ou de outros, não é, portanto, contrária à doutrina Budista.
4. Na visão Budista, o Estado desempenha um papel fundamental na justiça social. Mesmo assim, em um sistema econômico Liberal que não possui uma situação de mercado verdadeiramente perfeita, o Estado necessita facilitar a igualdade de oportunidades para os pobres antes que haja a possibilidade de alcançar uma vida digna. Nesse sentido, nós podemos dizer que o Estado, segundo a perspectiva Budista, também tem que garantir a liberdade de oportunidades.
5. O Budismo concede a liberdade de escolher ocupações de acordo com as habilidades e capacidades de cada pessoa, entretanto, essa liberdade tem que estar dentro dos limites da moralidade. O uso da liberdade sem a orientação ou o controle da moralidade trará efeitos negativos para a sociedade como um todo.
Nós podemos observar, no entanto, que o Budismo enfatiza a busca pela felicidade ou benefício que tem como guia a moralidade (sīla), o dhamma e o princípio da não exploração e, portanto, ele diz aos empreendedores ou homens de negócios que a busca por benefícios nos negócios tem que ser justa e não uma exploração da sociedade ou do meio ambiente. Ao mesmo tempo, outro ponto importante é que as questões de ética nos negócios também têm que ser abordadas nos hábitos de consumo, não apenas nas organizações de negócios.
A solução de problemas éticos nos negócios
1. Produção
1.1 Produção em aspecto financeiro (economics) significa criar e transformar um objeto em alguma coisa diferente, a fim de fazer com que seja valiosa em termos de utilidade ou satisfação, ou valiosa em termos de mercado. Um problema persistente da produção é que o processo produtivo, no sistema de negócios, é baseado no princípio de usar os recursos de produção para maximizar os lucros, sem levar em conta as consequências que podem surgir, como exploração, poluição ambiental, etc.
Em seu livro ‘Aspectos Financeiros Budista’, Phra Debvedī expressa pontos que, ao se produzir, nós pensamos que nós estamos criando coisas, mas, na verdade, nós estamos apenas transformando coisas — transformando alguma coisa em alguma coisa mais, a partir de uma substância em outra, a partir de um tipo de trabalho em outra coisa mais. Esse tipo de transformação está criando uma nova condição por destruir a condição anterior. Assim, a produção sempre envolverá destruição. Alguns tipos de destruição não são aceitáveis, portanto, algumas questões sobre a produção econômica permanecem para consideração. Por exemplo, o valor de alguns produtos é igual apenas ao que é destruído, caso em que há a questão de produzi-los ou não. Em alguns casos, pode ser melhor abandonar essa produção e tal abandono é uma atividade que promove a qualidade de vida. Como resultado, não é correto para o novo conceito de economia julgar as pessoas apenas pelo fato de elas produzirem ou não. A não produção pode ser uma boa ação ou atividade econômica. Nós temos que considerar a produção como sendo de dois tipos: a produção que tem um valor igualmente produtivo e destrutivo (tal como a produção que destrói recursos naturais e danifica o meio ambiente) e a produção que visa diretamente a destruição (como a fabricação de armas). Há a produção que tem um resultado positivo e a produção que tem um resultado negativo, a produção que promove a qualidade de vida e a produção que a destrói.[23]
[23] Phra Debvedī, Economia Budista, pp.38–39.
Os fabricantes devem, portanto, empregar a ética Budista como diretriz em suas atividades econômicas. Os princípios que podem ser aplicados na produção são Meio de Vida Correto — ter um meio de vida ou negócio que produza bens benéficos à humanidade, não produzindo itens nocivos como venenos, narcóticos ou substâncias viciantes perigosas, armas letais, etc. O princípio do benefício também deve ser usado, ou seja, produzir em quantidade adequada à demanda do mercado e produzir bens de boa qualidade e durabilidade. Os produtores não devem produzir produtos de baixa qualidade na expectativa de lucro com as pessoas tendo que comprar novos itens repetidamente sem qualquer consideração pelo benefício do consumidor. Eles devem usar o princípio da não exploração, escolhendo cuidadosamente a tecnologia de produção e não usando recursos naturais em excesso a ponto de destruir o equilíbrio do meio ambiente natural, o que significa exploração da natureza e dos próprios seres humanos.
O Aggañña Sutta, que narra a origem do mundo humano, reflete o ponto de vista Budista sobre a ecologia, no qual os seres humanos e a natureza estão unidos e inter-relacionados. As atividades de produção, de acordo com o Budismo, têm que, portanto, estar em harmonia com a ecologia e contribuir para o equilíbrio normal da natureza. Portanto, a produção, de acordo com a ética Budista, deve ser de bens e serviços que não sejam prejudiciais à vida, mas sim benéficos à conduta de uma vida boa (sammāmagga), levando em consideração os benefícios para o corpo e a mente, bem como a preservação do meio ambiente. Bens que prejudicam a saúde física ou mental e o meio ambiente são, de acordo com o Budismo, de pouco ou nenhum benefício. Assim, a produção, de acordo com o Budismo, é tal que visa à felicidade e à paz para os membros da sociedade, permitindo-lhes sustentar as suas vidas razoavelmente de acordo com as suas rendas, nem muito mal nem muito extravagantemente e não causando dificuldades aos outros. A abordagem de problemas éticos na produção requer o uso do princípio do Meio de Vida Correto; ou seja, os fabricantes devem produzir bens que tenham valor para a vida e não explorar a si mesmos, aos outros ou ao meio ambiente e devem levar em consideração o benefício dos consumidores.
1.2 Sobre a questão do trabalho em produção, a economia Liberal considera o trabalho como um custo que deve ser minimizado. Assim, ela busca empregar cada vez mais tecnologia na produção para reduzir custos e aumentar a produtividade. Levar em conta demais a eficiência da produção às vezes causa conflitos entre empregadores e empregados. Para reduzir tais conflitos, os fabricantes devem tratar os seus trabalhadores como seres humanos, não como meros trabalhadores no processo de produção, que sempre podem ser substituídos por máquinas. Os conflitos entre empregadores e trabalhadores mais frequentemente encontrados têm muitas causas. Por exemplo, os trabalhadores não estão interessados em assumir a responsabilidade por suas funções e pelo trabalho deles devido à falta de familiaridade com o estilo de vida de uma sociedade industrializada ou qualquer outro estilo de vida que não seja agrícola; os empregadores não cumprem as leis trabalhistas; os empregadores usam métodos injustos para administrar os trabalhadores deles ou falham em entende-los; os trabalhadores exigem salários mais altos para acompanhar o custo de vida e os empregadores se recusam a concedê-los. Essas situações levam a conflitos. Nesses conflitos, se um lado ganha, o outro perde. Por exemplo, se um empregador aumenta os salários de seus trabalhadores, ele sentirá que os seus custos de produção aumentaram. No entanto, a maioria dos conflitos começa com a sensação dos trabalhadores de que os seus empregadores estão se aproveitando deles ou os tratando de forma injusta, o que os leva a formar grupos para reivindicar o que desejam ou entrar em greve. O resultado é a destruição mútua, causando desperdício de recursos humanos e levando à destruição dos recursos naturais do país, além de problemas de desemprego.
Se nós examinarmos cuidadosamente esses conflitos, nós veremos que a sua principal causa é o egoísmo, tanto de trabalhadores quanto de empregadores. Os trabalhadores são egoístas por não se importarem com a eficiência de sua produção e não levarem em conta as situações econômicas, sociais e outras, incluindo os problemas de seus empregadores, enquanto os empregadores são egoístas por tentarem maximizar os seus lucros e, portanto, não se importam com os sentimentos dos trabalhadores ou com o que é justo. Tais conflitos não surgiriam se ambas as partes tentassem encontrar um ponto de encontro em seus pensamentos, atividades e benefícios, aderindo ao ensinamento Budista chamado sārāṇīyadhamma (qualidades que levam à conciliação), dado pelo Buda, no qual cada um dos pontos é capaz de ser aplicado para encontrar um ponto de encontro da seguinte forma:
1) Um ponto de encontro sobre opiniões: Quando as pessoas trabalham juntas, elas têm que ter pensamentos comuns, de acordo com o princípio de diṭṭhisāmaññatā, que significa igualdade de opiniões, consenso. Quando ocorrem problemas comuns, todos se reúnem para corrigi-los com boa vontade mútua (mettā). Isso se chama mettāmanokamma: estabelecer ações mentais gentis, imbuídas de boa vontade, amor, benevolência e o desejo de olhar uns para os outros sem aversão, perigo ou exploração. Ambas as partes têm que tentar desenvolver esse tipo de sentimento e não transferir o fardo para apenas uma delas. Além disso, existem os princípios para estabelecer o entendimento mútuo por meio da comunicação linguística, mettāvacīkamma. Isso é falar com base na boa vontade, não usando as próprias emoções ou aversões pessoais no trabalho, mas expressando palavras que sejam verdadeiras, conciliatórias; a continuidade e o progresso do trabalho também significam a continuidade e o progresso dos negócios, ao invés de cada uma das partes lutar para obter resultados excessivos. A ganância leva à destruição, como afirmado no Saṃyutta Nikāya, Sagāthavagga: ‘A ganância é perigosa para todo o dhamma’[24] e ‘O desejo derruba os homens’[25] e a discussão das razões para a sabedoria inferior e a falta de reflexão sobre as consequências, tanto diretas quanto indiretas, tanto para o dono do negócio quanto para os funcionários. Quando o raciocínio e a atenção plena são dominados pelo desejo, a inteligência no trabalho desaparecerá, restando apenas a tolice. Isso é destrutivo para si mesmo e para os outros, como no ditado: ‘A riqueza mata o tolo, não aqueles que buscam o suporte. Por causa da ganância dele, o tolo se mata, assim como ele mataria outro’.[26]
[24] Saṃyutta Nikāya, Sagāthavagga, 15/73.
[25] Saṃyutta Nikāya, Sagāthavagga, 15/79.
[26] Khuddaka Nikāya, Dhammapada, 25/93.
2) Um ponto de encontro em atividades: Trata-se da realização de atividades com base em expressões físicas que refletem amor e boa vontade mútuos. Isso deve se basear nos princípios do relacionamento entre empregadores e empregados, ou nos deveres entre empregadores e empregados. O Buda os descreveu assim:
Os empregadores devem apoiar os empregados deles por: 1) designar tarefas adequadas à força física, gênero, idade e capacidade; 2) pagar um salário de acordo com a tarefa atribuída e o custo de vida; 3) proporcionar bem-estar, tal como assistência médica em caso de doença; 4) compartilhar quaisquer benefícios extras com eles; 5) conceder dias de folga para descanso, conforme apropriado.
Os empregados devem responder a esse apoio por: 1) começar a trabalhar antes do empregador deles; 2) terminar o trabalho depois do empregador deles; 3) aceitar apenas o que lhe é dado pelo empregador e serem honestos; 4) esforçar-se por melhorar o trabalho deles; 5) espalhar as virtudes dos empregadores e negócios deles.[27]
[27] Dīgha Nikāya, Pāṭikavagga, 11/171.
3) Um ponto de encontro sobre interesses: Esse é um problema muito importante porque, em todos os tipos de trabalho, as pessoas buscam benefícios. Conflitos e inimizades frequentemente começam com conflitos de interesses. Donos de negócios desejam o máximo lucro a partir dos investimentos deles para expandir os seus negócios e aumentar a riqueza deles o máximo possível, por isso eles tentam minimizar despesas e maximizar lucros. Os funcionários desejam o máximo retorno possível a partir do trabalho deles. Como os seus interesses caminham em direções opostas, é necessário um ponto de encontro em pensamento, de modo que ele una os benefícios com base na bondade amorosa, ou seja, ‘… compartilhar as aquisições legítimas uns com os outros, não guardando apenas para si’.
Entender a importância de compartilhar promove a estabilidade, pois, para que uma parte sobreviva, a outra também tem que sobreviver: ambas as partes têm que depender uma da outra. Visar apenas acumular benefícios para si mesmo é um obstáculo à felicidade, como diz o Budismo: ‘Ele que come sozinho não come feliz’.
A implementação dos princípios de sārāṇīyadhamma ajudará a criar boas relações entre empregadores e trabalhadores. Para que os trabalhadores tenham boas relações com os empregadores, eles têm que se esforçar para realizar o seu trabalho da melhor forma possível e assim a eficiência da produção será melhorada.
A nossa discussão de produção descreve as características da produção que é moralmente corretas, mas não apenas correta moralmente. Esse conceito de produção também pode gerar eficiência na produção, uma vez que recursos limitados são utilizados adequadamente e a mão de obra é utilizada de forma mais eficiente devido à boa motivação no trabalho.
2. Marketing
Após a conclusão do processo de produção, bens e serviços são inseridos no processo denominado ‘marketing’. De acordo com os aspectos econômicos, os consumidores desejam comprar produtos a preços baixos, enquanto os produtores desejam vendê-los a preços altos. Por essa razão, os produtores têm que maximizar os seus lucros minimizando os custos e, em seguida, precificar os produtos o mais alto possível. Isso leva a resultados positivos e negativos. Positivamente, isso leva à pesquisa tecnológica para fabricar produtos ao menor custo, o que poderia significar produtos mais baratos para os consumidores. Negativamente, isso leva à subvalorização da mão de obra, à subvalorização dos fatores de produção e à liberação de substâncias tóxicas resultantes dessa produção, que poluem o meio ambiente. Para solucionar esses resultados negativos, nós apresentaremos aqui os princípios da ‘ética de mercado’ Budista, para que o mercado sirva como uma resposta às necessidades das pessoas em relação às necessidades básicas da vida e não apenas como um mecanismo para lucros ilimitados sem preocupação com as pessoas.
O Budismo não proíbe a busca por riqueza ou lucro, como demonstrado no Aṅguttara Nikāya, Tikanipāta (20/458), que se refere a comerciantes e chefes de família que obtêm grandes quantias de riqueza como ‘pessoas com visão de futuro que sabem por quanto compraram as suas mercadorias, quanto elas têm investido, por quanto elas venderão as suas mercadorias, quanto lucro elas terão e quanto elas terão de retorno sobre o investimento. Elas são inteligentes em seus negócios’.
A partir do exposto, nós podemos ver que o Budismo ensina os comerciantes a antecipar e analisar as situações de mercado, a saber quanto comprar e vender para obter lucro e a saber quais produtos têm boa liquidez, significando quais bens estão em alta demanda e estão em suficiente suprimento para serem comercializados convenientemente. Tudo isso não significa que seja bom negociar qualquer tipo de bem que gere lucro, pois o Buda recomendou evitar certos tipos de bens, chamando-os de micchāvaṇijjā: negócios que devem ser evitados por um seguidor leigo Budista (upāsaka ou upāsikā). Existem cinco deles:
1. satthavaṇijjā: comércio de armas de destruição, tais como lanças, espadas, armas de fogo, etc.;
2. sattavaṇijjā: comércio de seres humanos;
3. maṃsavaṇijjā: comércio de gado e carne;
4. majjavaṇijjā: comércio de intoxicantes;
5. visavaṇijjā: comércio de venenos.[28]
[28] Aṅguttara Nikāya, Pañcaka-Chakkanipāta 22/177.
O comércio de armas é proibido porque elas são ferramentas para matar e destruir. Buscar lucro a partir da venda de armas equivale a lucrar com a morte e a destruição de seres humanos. O comércio de seres humanos é proibido porque os seres humanos nascem iguais. Todas as pessoas são igualmente seres humanos, portanto, comprar e vender outras pessoas é extremamente errado. Tal comércio rebaixa a dignidade humana ao nível de animais ou objetos inanimados. Isso é exploração, um grupo reprimindo e explorando outro como mercadoria.
O comércio de gado é proibido porque todos os seres amam a vida. Vender e buscar lucro com o comércio de animais é uma forma de exploração porque faz com que as pessoas saiam por aí capturando animais e os confinando para serem vendidos, ao custo de grande sofrimento para os animais. O comércio de carne para alimento também é proibido. Para os leigos, tem que haver algum abate de animais para alimentação, porém, tal abate deve ser feito apenas de acordo com a necessidade de consumo, o que significaria apenas um pequeno abate. Se os animais são mortos comercialmente, no entanto, um grande número de animais está envolvido. Isso é lucrar com a vida dos animais, o que é um tipo de exploração mais sério do que matar para consumo.
O comércio de bebidas intoxicantes é proibido porque o seu consumo é causa de atividades que levam ao sofrimento. Elas são prejudiciais de muitas maneiras, tanto para si mesmo quanto para os outros. O Tipiṭaka lista seis desvantagens do consumo de bebidas alcoólicas, como segue:
1. o patrimônio desaparece visivelmente;
2. brigas são causadas;
3. a saúde física e mental são prejudicadas;
4. há desonra para si mesmo;
5. a pessoa se torna desavergonhada;
6. a inteligência é prejudicada.[29]
[29] Dīgha Nikāya, Pāṭikavagga, 11/198.
O Buda considerava a bebida uma das causas mais graves da ruína, por isso ele proibiu o comércio de bebidas intoxicantes. O comércio de venenos é proibido porque eles matam pessoas ou, pelo menos, são seriamente prejudiciais à mente e ao corpo. Hoje em dia, nós constatamos que a maioria dos empreendedores se concentra apenas em custos baixos e altos lucros. Eles farão qualquer tipo de negócio, desde que gere altos lucros. Portanto, nós vemos o comércio de armas, de lanças e espadas até armas de fogo, gases venenosos, bombas e armas nucleares, que são capazes de matar dezenas de milhões de pessoas de uma só vez. Aqueles que vendem essas armas obtêm lucro e enriquecem, entretanto, aqueles que as usam morrem em números incontáveis.
Seres humanos são vendidos em muitos locais de entretenimento, tais como bares e bordéis. Mulheres são enganadas e forçadas à prostituição. Algumas pessoas compram crianças e mulheres e as obrigam a trabalhar sem remuneração em fábricas, tratando-as como escravas. Animais e carne são vendidos amplamente. Alguns animais selvagens têm se tornado extintos porque as pessoas os capturam ou caçam para vender. Alguns são mantidos em cativeiro à espera de serem vendidos a países estrangeiros. Trata-se de lucros obtidos com o sofrimento dos animais. Os abatedores buscam lucro com a carne, o sangue e as vidas de inúmeros animais. Às vezes, para maximizar os lucros, os animais excedentes são incinerados ou jogados no mar, causando um enorme desperdício de vidas.
Bebidas alcoólicas são vendidas como completamente normais e os alcoólatras são numerosos. Dinheiro é desperdiçado, a saúde é arruinada, discussões inflamadas e erros são cometidos no local de trabalho devido à descuido causado a partir da embriaguez.
Embora a venda de venenos seja controlada, muitas substâncias venenosas são amplamente disponibilizadas para extrair lucro de pessoas ignorantes, desde analgésicos, tranquilizantes, bebidas estimulantes e glutamato monossódico até corantes alimentícios e cosméticos carregados de substâncias químicas venenosas.
Na visão Budista, vender essas coisas é prejudicial a outras pessoas e à sociedade como um todo. Se a sociedade como um todo estiver perturbada, instável e confusa, eventualmente todos serão afetados, mesmo aqueles que realizam esses negócios. No Kandaraka Sutta do Majjhima Nikāya (13/12), são mencionados vinte e seis tipos de pessoas que não causam problemas a si mesmas ou aos outros e um deles, o de número 24, trata do comércio, afirmando: ‘Abster-se de trapacear com a balança, enganar com falsificações e trapacear com instrumentos de medição’. No entanto, a realidade de mercado na sociedade é que essas coisas são comuns. Os comerciantes adulteram os produtos deles, arruinando a reputação do país. Exemplos disso são a adulteração de tabletes de mandioca com pedrinhas, areia e sabugo de milho, ou a adulteração de óleo com água e corante para obter mais lucro.
O 25º ponto afirma que a mentira causa problemas a outras pessoas e deve ser evitada. No entanto, nós vemos propagandas elaboradas para nos enganar com a expectativa de aumento nas vendas. Por exemplo, alguns produtos locais de baixo custo são anunciados como importações caras e produtos nocivos, como glutamato monossódico e certos cosméticos, são retratados como úteis e benéficos. Esse tipo de propaganda distorce os sentimentos dos consumidores em favor dos produtos anunciados, o que é tudo uma farsa.
O princípio ético Budista que é capaz de ser aplicado às atividades de marketing é pañcasīla, os Cinco Preceitos, que é o nível mínimo de regras de treinamento para a conduta humana. Pañcasīla consiste em:
1. abster-se a partir de pāṇātipāta: não matar e viver uma vida livre de exploração física;
2. abster-se a partir de adinnādāna: não tomar o que não é dado e viver uma vida livre da exploração de outros em termos de riqueza e posses;
3. abster-se de kāmesumicchācāra: abster-se de má conduta sexual, viver uma vida livre de exploração de terceiros em relação ao cônjuge ou entes queridos e ser fiel aos costumes sexuais e ao cônjuge;
4. abster-se de musāvāda: não falar falsamente e viver uma vida livre de exploração de terceiros por meio de discursos falsos, mentiras, enganos, privação de interesses ou difamação;
5. abster-se de surāmerayamajjapamādaṭṭhāna: não consumir bebidas alcoólicas que sejam causa de negligência, ou seja, abster-se de substâncias tóxicas e viver uma vida livre de negligência, descuido e ilusão causadas por narcóticos que prejudicam a atenção plena e a compreensão.[30]
[30] Suttanipāta Aṭṭhakathā, 2/226.
Se as pessoas que lidam com negócios seguissem rigorosamente os Cinco Preceitos, não haveria negócios antiéticos, como o comércio de armas e narcóticos. A apāyamukha (caminhos para a ruína) e as indústrias viciosas, bem como a fraude e o engano por diversos meios, não surgiriam. Da mesma forma, sem demanda, não haveria oferta: ou seja, não haveria produção ou serviço. Portanto, também cabe aos consumidores corrigir os seus próprios hábitos.
Reunindo os princípios e ensinamentos que tratam do comércio no Budismo, nós podemos concluir que as transações de negócios, de acordo com a ética Budista, têm que estar em conformidade com o Modo de Vida Correto, sem explorar a si mesmo nem aos outros. Não explorar os outros, no Budismo, refere-se não apenas aos seres humanos, mas a todos os seres; ou seja, a todos os sistemas de vida que se inter-relacionam no ambiente composto por seres humanos, natureza e sociedade. O modo de vida da humanidade tem que se relacionar e depender desses três elementos. Portanto, as operações de negócios têm que ser tais que não explorem a si mesmos — não danifiquem a qualidade de vida, mas sim a desenvolvam e a promovam — e não explorem os outros — não criem sofrimento na sociedade nem destruam a qualidade do meio ambiente.
Lucro
Em negócios, os lucros são o retorno sobre investimentos e sobre o trabalho e são os incentivos para a continuidade dos negócios. Uma questão a ser considerada é: uma vez que a meta suprema do Budismo é nibbāna e que é um estado de liberação de todo desejo e apego, a maximização do lucro, que está diretamente relacionada ao egoísmo, é contra a ética Budista — um homem de negócios que busca o lucro máximo é capaz de ser um bom Budista? Em outras palavras, nibbāna é um estado em que não há mais apego a attā (eu, ser, self), o que significa que aqueles que alcançam isso não têm egoísmo. Em termos de negócios, no entanto, o egoísmo ou a maximização do lucro é o maior estímulo para o início das atividades em negócios. Parece que a busca pelo lucro máximo contradiz o caminho para a meta final, nibbāna. Para considerar essa questão, o pesquisador acredita que nós temos que começar com outra questão: se um Budista que não é capaz de atingir nibbāna ainda é capaz de ser considerado um bom Budista ou não.
Para responder a essa pergunta, nós temos que admitir que a ética Budista é dividida em dois níveis, que são:
1. Nível Lokiya (mundano), que é o nível para aqueles que ainda buscam a felicidade mundana. A vida em negócios se classifica nesse nível.
2. Nível Lokuttara (supramundano), que é para aqueles que aspiram a uma felicidade que está além do nível mundano, que é o estado de extinção de todas as impurezas e todos os sofrimentos, ou seja, nibbāna.
Segundo o Budismo, uma pessoa moral é aquela que vive de acordo com o caminho (magga) e praticar de acordo com o caminho é o maneira para três níveis de metas, a saber:
1. Diṭṭhadhammikattha: metas iniciais. Refere-se aos benefícios que podem ser observados na vida cotidiana, ou às coisas comuns que as pessoas almejam nesse mundo, como posses, posição social, honra, felicidade, elogios, riqueza, dinheiro etc., que têm sido obtidos de forma legítima. Benefícios ou lucros obtidos de forma legítima em negócios estão incluídos nesse nível de meta.
2. Samparāyikattha: metas futuras. Refere-se ao desenvolvimento do corpo e da mente, bem como dos valores mentais, às realizações meditativas conhecidas como jhānasamāpatti.
3. Paramattha: metas mais elevadas. Refere-se ao reconhecimento da realidade de todas as coisas como elas realmente são, tendo uma mente livre de impurezas (kilesa). É chamado de liberação (vimutti) ou nibbāna.
Os dois primeiros níveis são mundanos, enquanto o terceiro nível é supramundano. O Budismo aceita a importância de todos os níveis de metas na vida, de acordo com a prontidão de cada indivíduo. Embora o ideal seja que todos alcancem a meta suprema de nibbāna, o Budismo admite que nem todos são capazes de atingir essa meta final.
A partir dos princípios acima, nós somos capazes de resumir que, embora alguns Budistas não consigam atingir a meta mais elevada, nibbāna, que é a meta no nível supramundano, eles são capazes de atingir metas nos níveis diṭṭhadhammikattha ou samparāyikattha, que são mundanas, se seguirem o caminho de magga, isso é, se tiverem ‘sīla’ (moralidade) em suas vidas e também eles são capazes de ser bons Budistas. Portanto, homens de negócios que administram os seus negócios moralmente também são capazes de ser bons Budistas. Por essa razão, o Budismo fornece ensinamentos apropriados e diretrizes práticas para Budistas que ainda não são capazes de atingir nibbāna e ainda estão buscando a felicidade mundana.
Nós temos aprendido com os princípios Budistas relativos à riqueza que o Budismo permite que os chefes de família busquem e possuam riqueza de acordo com a sua capacidade e disposição individuais, dentro de limites, desde que eles não explorem a si mesmos ou aos outros. Há também os princípios que levam a metas imediatas (di hadhammikattha), que dizem respeito à riqueza econômica. Existem quatro deles:
1. u hānasampadā (dotação de diligência): aplicação diligente ao trabalho, viver honestamente e saber examinar métodos para executar o próprio trabalho de modo que seja frutífero;
2. ārakkhasampadā (dotação de proteção): saber como proteger a riqueza obtida com o trabalho diligente do perigo ou da deterioração;
3. kalyāṇamittatā (ter um bom amigo): associação com pessoas boas; e
4. samajīvitā (vida equilibrada): ter um estilo de vida equilibrado.
Nós podemos ver a partir dos quatro princípios acima que o que leva à prosperidade econômica, na visão Budista, é o sustento honesto e a diligência e, a partir do segundo princípio, ter obtido riqueza de forma correta, administrá-la bem e não deixá-la desaparecer. Portanto, a acumulação de riqueza ou fundos não é contrária aos princípios Budistas. O Budismo nunca condenou um milionário simplesmente por ser milionário, pois a riqueza conquistada de forma justa por meio de trabalho árduo não é alguma coisa a ser condenada. Por isso, se um homem de negócios estiver pronto e capaz, ele pode buscar riqueza ou lucro, armazená-los de forma correta e acumular o máximo que ele puder, na medida em que o potencial dela/dela permitir.
Buscar o lucro máximo dentro dos limites da justiça e da moralidade não é contrário à ética Budista no plano mundano. Novamente, embora o Budismo aceite que os Budistas são capazes de buscar o lucro máximo de acordo com o sistema capitalista, têm-se que entender que a maximização do lucro significa um lucro máximo justo, obtido por meio de um processo puro, um lucro obtido por meio de um sistema comercial criado de forma eficiente, sem explorar ou violar os outros.
Conclusão
Nós temos descrido o conceito de aspectos econômicos segundo a ética Budista e nós constatamos que uma economia segundo a ética Budista envolve cinco princípios básicos — propriedade, liberdade, um sistema de operações voltado para o mercado, concorrência e o papel do Estado — assim como no sistema econômico Liberal. Isso demonstra que os princípios Budistas não contradizem os do sistema econômico Liberal. Mesmo assim, o Budismo sugere soluções para os problemas éticos existentes nas operações em negócios sob o Liberalismo, que podem ser resumidas da seguinte forma:
1. uma solução de Caminho do Meio para aspectos econômicos (majjhimā paipadā) que se concentra na suficiência;
2. uma solução de aspectos econômicos sem exploração de si mesmo, dos outros ou do meio ambiente;
3. atividades econômicas como base para um maior desenvolvimento humano.
De acordo com a primeira característica, uma solução de aspectos econômicos que se concentra na suficiência, a forma de consumo será tal que responda às necessidades físicas. Assim, recursos naturais limitados e custos sociais, tais como solo, água, ar e recursos naturais, são utilizados com parcimônia e apenas na medida necessária.
Como os valores ou hábitos de consumo, segundo a ética Budista, são baseados no princípio do consumo por necessidade e não para a expressão de status social, bens extravagantes como perfumes e carros, produtos nocivos à saúde como cigarros e bebidas alcoólicas, produtos que levam à destruição da vida, tais como armas, bem como serviços que levam à imoralidade, diminuirão ou eventualmente desaparecerão. Isso é possível graças ao princípio da oferta e da procura. O princípio da oferta e da procura atinge o equilíbrio quando a oferta e a procura estão ambas em sintonia. Se os valores ou hábitos de consumo estiverem de acordo com a ética Budista, não surgirão demandas desnecessárias e, consequentemente, não haverá oferta. A oferta será uma resposta às demandas reais, não às demandas impostas aos consumidores pelos fabricantes.
A segunda característica, aspectos econômicos sem exploração de si mesmo, dos outros ou do meio ambiente, fará com que um processo de produção baseado na ética Budista se concentre na facilidade, simplicidade e economia de custos, sem exploração da mão de obra. O emprego da tecnologia no processo de produção terá como objetivo facilitar o trabalho humano, não substituí-lo e não forçará os seres humanos à escravidão das máquinas. O trabalho humano em qualquer economia baseada na ética Budista é tal que permite que os seres humanos se desenvolvam. Ele será enérgico e dinâmico, o que, na prática, significa que as pessoas trabalham da melhor forma possível. A eficiência da produção será aumentada sem a necessidade de violar os princípios morais. Nesse sistema, os seres humanos são mais importantes do que os bens.
Como uma economia de acordo com a ética Budista enfatizaria a produção de acordo com as necessidades do consumidor, os bens e serviços não seriam diversificados de maneira excessiva. Assim, os consumidores não seriam induzidos ao consumo máximo ou excessivo. O emprego de tecnologia simples e a manutenção do foco nos seres humanos significariam que a dignidade seria conferida ao ser humano e a natureza não seria explorada.
A terceira característica, as atividades econômicas como uma base para o desenvolvimento humano, significa que, uma vez que os seres humanos alcancem o bem-estar econômico, eles não pararão por aí. A estabilidade econômica deles será a base para que eles alcancem um nível mais alto, rumo a uma vida saudável, de acordo com o Budismo. Uma vida saudável é uma vida praticada de acordo com o caminho, magga, cujo resultado são metas em diferentes níveis, desde as metas iniciais até a meta final do Budismo, que é nibbāna, o estado em que todo sofrimento é extinto. Esse é o estado mais capaz de resolver eficazmente os problemas humanos e ele representa a mais alta qualidade de vida.
Os infratores de violações da ética nos negócios geralmente citam como uma desculpa que, se eles não pudessem fazê-lo, a eficiência da produção seria reduzida. Entretanto, a experiência tem provado que tais desculpas estão equivocadas, pois as violações da ética não têm levado ao aumento da eficiência e da liberdade. A resposta Budista oferece liberdade e eficiência na produção, desde que haja controle mental tanto por parte dos consumidores quanto dos fabricantes. Práticas antiéticas não serão corrigidas simplesmente dizendo aos fabricantes para não as praticarem. Os consumidores também necessitam mudar os seus hábitos. A abordagem para resolver problemas éticos na operação de negócios, segundo a ética Budista, enfatiza, portanto, a adaptação dos valores e hábitos dos consumidores, ao mesmo tempo em que resolvem problemas espirituais.”
Buscar o lucro máximo dentro dos limites da justiça e da moralidade não é contrário à ética Budista no plano mundano. Novamente, embora o Budismo aceite que os Budistas são capazes de buscar o lucro máximo de acordo com o sistema capitalista, têm-se que entender que a maximização do lucro significa um lucro máximo justo, obtido por meio de um processo puro, um lucro obtido por meio de um sistema comercial criado de forma eficiente, sem explorar ou violar os outros.
[Traduzido a partir da versão Tailandesa por Bruce Evans]
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A Espiritualidade nas Empresas trata-se de uma Filosofia cujos Princípios são capazes de ajudar tanto as Pessoas quanto as Organizações.
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